segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Freeze! Tom Waits - Bad As Me


Tom Waits é uma personagem monstruosamente grande que se ostenta cheio de portas e janelas, dividido infinitamente por divisões grandes e pequenas, e construído por aquele complexo material que se chama América, e que, por assim se chamar, tudo inclui, com o seu habitual tempero. Cada álbum de Tom Waits é uma viagem pelos incertos meandros da sua personalidade, numa visita guiada pelo próprio ao próprio. Cada álbum de Tom Waits é apenas uma outra visão de um mesmo modelo que, por se revelar tão extraordinário, acaba por nunca se gastar. E é por isso que Bad as Me se apresenta confortável, seguro, com alicerces que não caem.

Em 2011, com 61 anos, o Tom Waits que se nos mostra deixa de parte a agressividade de Real Gone, seu último registo de estúdio, e varia brusca mas coerentemente por entre euforias e ritmos fortes, em ambiente de festa e delírio, e o banco de veludo do piano, ao canto do lúgubre bar, em que a voz perde sinais do bagaço e se entranha em lamentos, dedicatórias, e palavras de amor. Talvez haja uma calmaria no Waits de Bad as Me, como se o alcoól próprio que lhe corre nas veias se acalmasse, e este voltasse aos dias de Small Changes, mas com uma cabeça envelhecida 35 anos em casco de carvalho e um chapéu de coco. Pois se há alturas em que o músico acorda subitamente e se ouve o rugido forte e intenso das guitarras, da percussão, e do próprio gigante que é Waits, o que fica são esses momentos em que a sua voz se senta, e acompanhando um contrabaixo, revisita as teclas brancas e pretas e parece evocar os beijos de uma Billie Holiday, os amores tidos e perdidos, uma paz que parece teimar em não aparecer, um amargo que lhe agrada a vida.

Bad as Me é assim mais uma peça no intrincado labirinto que é Tom Waits e, portanto, detentora da quase adimensionalidade e intemporalidade a que há muito este nos tem vindo a habituar.

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